FERNANDO BRITO, no Tijolaço
Leio muitas bobagens – parte delas bem intencionadas, até – que atribuem o drama que atravessamos aos “caprichos” de Lula em querer manter-se candidato e de não ter reconhecido que Ciro seria candidato mais bem sucedido na disputa.
Outros dizem que “faltou autocrítica” ao PT pelos desvios de conduta de alguns de seus integrantes, numa visão de um imaginário “leninismo católico”, numa visão de que o arrependimento produziria a epifania da verdade e a conversão às boas políticas.
Não nego nem a uma nem a outra atitude importância na política, mas jamais as vejo quando distancio o olhar para o panorama histórico.
A presença de alguém como Jair Bolsonaro como símbolo e líder da direita brasileira não é um acidente provocado pela “teimosia” de Lula ou porque alguns picaretas do PT e de outros partidos abocanharam dinheiros públicos.
Bolsonaro é um produto, antes de tudo, da degradação da elite brasileira, que não consegue mais produzir valores minimamente civilizados capazes de sustentar o seu “não-projeto” para o país, o qual se resume, faz tempo, apenas na predação de nossas riquezas e do fruto do trabalho de nosso povo, na qual buscam ser os gerentes do entreposto.
Ou, no que, em uma palavra, se reduziu a economia: “O Mercado”.
As extensões burocráticas desta elite, as classes médias ligadas à burocracia estatal e privada sofreram, igual, este processo de degradação. E isso se expressa, com clareza solar, em todos os campos da cultura: literatura, música, arte em geral, nos símbolos de valor e inserção social, seja no consumo mais amplo, sejam nos ícones de indumentária, pertencimento coletivo, seja nos caminhos de identificação de valor dos indivíduos.
Tudo isso aconteceu, não apenas no período dos governos petistas, mas nos anteriores, especialmente na década de 90, em todos os campos – desde os mais altos, com a substituição dos capitães de indústria pelos “gestores de capitais” quanto no caldeirão da cultura social.
Há alguns anos, nele se jogou o ingrediente final, aquele que “engrossou o caldo”: a judicialização do país, criando os tribunais da inquisição que legitimaram a mídia para promover suas fogueiras de reputação, que levaram de roldão toda a camada dirigente da política, inclusive aqueles que lhes riscaram os fósforos.
Foram para o poste em meio às chamas com o monstro que ajudaram a criar.
O drama do Brasil não foi criado pela esquerda, pelo PT ou por seus erros, mas por um processo que, afinal, na aliança entre mídia e judiciário encontrou a forma de empalmar o poder, ainda que com a mais tosca de suas criaturas.
Este é o ponto central, o resto – inclusive as opções políticas de cada corrente política que, em tese, deveriam fluir naturalmente no confronto de 2° turno – é apenas o confeito deste bolo fétido.
São longas digressões que se deve fazer e isso não cabe no momento de combate final de duas semanas contra o triunfo do fascismo. Mas é importante para que não se caia num processo de autofagia que nos imobilize na luta.
É tudo o que querem nossos adversários, que forjaram a sólida aliança da mediocridade com o fanatismo.
De nós não esperem sejamos cúmplices nisso. Vamos chamar, chamar, chamar até ficarmos roucos todos os que têm, conosco, o dever de partilhar esta luta de salvação do Brasil.