Um grupo de políticos chilenos, liderados por três ex-ministros das Relações Exteriores do Chile, José Miguel Insulza, Juan Gabriel Valdés e Mariano Fernández, e pela senadora Isabel Allende, filha do ex-presidente Salvador Allende, lançou manifesto criticando o fim da Unasul, a União das Nações Sul-Americanas, e a criação de um órgão internacional de direita no continente, o ProSul. “Em política externa, o improviso é mau conselheiro”, destaca o manifesto.
O manifesto tem a assinatura de 26 personalidades, entre senadores, ex-embaixadores e dirigentes políticos de legendas como o Partido Socialista, PPD e Democracia Cristã. Eles reivindicam os êxitos alcançados pela Unasul e avaliam que o cenário de crise aguda na Venezuela mostra a importância de se contar neste momento com “mecanismos e instituições que possam intervir positivamente em favor de uma solução pacífica”.
O grupo lançou o Foro Permanente para a Política Exterior do Chile como um contraponto à iniciativa do presidente Sebastian Piñera de criar um órgão internacional de direita na América do Sul, o ProSul. Para os políticos chilenos, a iniciativa coloca ideologia na frente dos interesses nacionais e transforma em política de governo o que deveria ser uma política de Estado.
O foro avalia que a criação do ProSul foi feita sem estudo, sem trabalho preparatório e sem debate algum com a sociedade chilena. “Seus efeitos serão negativos, não somente pela improvisação, mas também porque representam mais um exemplo de uma prática latino-americana: criar instituições para logo depois desativá-las sob o pretexto de que não funcionam”, diz o manifesto.
O grupo defende que a solução de um cenário de crise como o que vive hoje a Venezuela depende de instituições e mecanismos que possam intervir conjuntamente a favor de uma solução pacífica. Isso requer um mecanismo de coordenação política, como a Unasul. “Para conquistar esses objetivos é necessário um intenso e persistente diálogo diplomático”. O foro chileno diz que a convocatória à criação do Prosul não cumpre tais condições.
O Prosul surgiu como uma ideia dos governos conservadores do continente para substituir a União das Nações Sulamericanas (Unasul), criada em 2007, com grande participação do Brasil e do ex-presidente Lula. A Unasul tem como objetivo criar um espaço de integração que ultrapasse a esfera econômica. Em seus anos de funcionamento, ajudou a resolver conflitos na região sem a interferência de países de fora do continente e criou o Conselho de Defesa da Unasul, aliança militar que tem o objetivo de traçar políticas comuns de defesa e organizar ações de emergência contra violações e ataques.
A ideia do Prosul traz em seu bojo a desmobilização dessa integração e enfraquece o bloco no cenário internacional. Os chilenos não foram os únicos a se manifestar contra o Prosul. O governo boliviano também declarou seu apoio à Unasul , que “segue vigente”.
O presidente do Chile, Sebastián Piñera, convocou a primeira reunião de cúpula do Prosul, para a próxima quinta-feira, 22 de março. O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, deve participar do encontro.
Eis a íntegra do manifesto:
A IMPROVISAÇÃO EM POLÍTICA EXTERNA É MÁ CONSELHEIRA
1. O presidente Piñera convidou a uma Cumbre de Chefes de Estado da América do Sul em 22 de março, em Santiago do Chile, com o propósito de criar um novo organismo regional, adicional aos existentes, denominado PROSUL.
2. Desgraçadamente se reitera uma modalidade de condução da política exterior caracterizada pela improvisação como constatamos em seu primeiro ano de governo. O PROSUL é una proposição feita sem consulta, sem trabalho preparatório, feita de um dia para outro. É uma simples ocorrência. Seus efeitos serão negativos, não somente pelo improviso, senão porque representam mais um exemplo da má prática latino-americana: criar instituições para logo suprimi-las com o pretexto de que não funcionam.
3. A UNASUL, que o PROSUL pretende substituir, apresentou falhas estruturais e operativas que a conduziram a sua eventual paralisia. A principal foi a regra da unanimidade que permitia que qualquer país pudesse paralisar seu funcionamento utilizando o simples mecanismo de direito a veto. Este foi utilizado pelo governo de Maduro para impedir a renovação da direção e seu bom funcionamento.
4. Mas isso não deve ocultar os êxitos de UNASUL no período em que funcionou normalmente. De fato, jogou um papel central na resolução pacífica da grave crise que viveu Bolívia no conflito que opôs a cinco autoridades departamentais com o governo do Presidente Morales. Assim mesmo, em Bariloche, em 2009, se resolveu no quadro de UNASUL a diferença surgida na região a raiz do Tratado Militar subscrito entre Colômbia e Estados Unidos. Na ocasião, o Presidente Uribe se comprometeu a suspender o estabelecimento de bases militares na Colômbia. Ademais, na mesma reunião se paralisou a ideia de Alan García de firmar um Tratado de Não Agressão, cuja única finalidade era acrescentar às tensões de Peru com Chile por puras razões de política interna. Também foram eficazes os resultados dos trabalhos dos Conselhos de Defesa e Infraestrutura.
5. O cenário da aguda crise da ditadura de Maduro mostra a importância de contar com mecanismos e instituições que possam intervir mancomunada e positivamente em favor de uma solução pacífica. Isso requer, como pretendia ser UNASUR, um mecanismo de coordenação política que garanta a paz, a estabilidade democrática e a integração da região. Para recuperar esses objetivos é necessário um intenso e persistente diálogo diplomático no seio de uma institucionalidade sólida e respeitada, com vocação de permanência muito além das opções ideológicas dos governos de ocasião. A convocatória para a criação do PROSUR não cumpre com estas condições. Nesse sentido, se sabe que em diversos países convidados, existe uma séria dúvida acerca das finalidades e eficácia da organização, assim como sobre sua envergadura e respaldo internacional.
6. A crise da Venezuela adquiriu uma dimensão global que ameaça converter o país no cenário dos conflitos das grandes potências mundiais. Ademais, o risco de uma intervenção militar naquele país, como se tem visto, promovida e liderada pelo governo dos Estados Unidos, continua sendo real. Por isso, é vital a confluência nacional e regional de todos os democratas de diferentes correntes políticas para condenar sem nenhuma ambiguidade qualquer tentativa de intervenção militar e velar por uma saída pacífica e democrática. O Chile deve manter uma política independente, segundo sua tradição de política exterior, que mantenha fluidas relações com todos os poderes mundiais e que manifeste sempre a firme vontade de integração regional e de zona de paz para o Continente.
7. Desde já manifestamos nossa disposição de colaborar com as autoridades na busca de formas mais eficientes de consertação e coordenação política em nível sudamericano assim como da confluência das diferentes iniciativas como de México e Uruguay e da União Europeia que buscam uma solução pacífica para a crise da Venezuela e que já têm obtido alguns pequenos mas significativos êxitos.
Foro Permanente de Política Exterior
1. Isabel Allende
2. Cristian Barros
3. Sergio Bitar
4. Karina Delfino
5. Adriana Delpiano
6. Álvaro Díaz
7. Jaime Ensignia
8. Mariano Fernández
9. Jaime Gazmuri
10. Francisco Huenchumilla
11. Ricardo Herrera
12. José Miguel Insulza
13. Ana lía Uriarte
14. Juan Pablo Letelier
15. Luis Maira
16. Marta Mauras
17. Carlos Eduardo Mena
18. Ricardo Núñez
19. Carlos Ominami
20. Yasna Provoste
21. Carlos Parker
22. Pedro Felipe Ramírez
23. Osvaldo Rosales
24. María Inés Ruz
25. Cecilia Valdés
26. Juan Gabriel Valdés