Portaria fere direito a aborto para vítima de estupro
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Portaria fere direito a aborto para vítima de estupro

Na prática, governo inviabiliza o atendimento nos serviços de saúde de mulheres e meninas que engravidaram em decorrência de violência sexual

28/08/2020 8:14

UMA PORTARIA QUE PERSEGUE AS MULHERES VÍTIMAS DE ESTUPRO TRANSFERE O DIREITO AO ABORTO LEGAL DA SAÚDE PARA A ÁREA POLICIAL

 

O ministro General interino do Ministério da Saúde editou nesta sexta feira uma portaria que dispõe sobre Procedimento de Justificação e Autorização da Interrupção da Gravidez nos casos previstos em lei, no Sistema Único de Saúde-SUS. Esta Portaria obriga médicos e profissionais da saúde a notificarem a polícia ao acolherem mulheres vítimas de estupro que procurem uma unidade de saúde pública para realizar um direito seu – aborto que é previsto em Lei.

Esta portaria ainda determina que, no termo de consentimento que as pacientes assinam para fazer a interrupção da gestação, haja uma lista dos riscos e dos desconfortos decorrentes do procedimento. Além disso, os médicos devem informar as mulheres que elas podem ver o feto ou embrião por meio de um exame de ultrassom antes da realização do aborto.

O ato desta sexta-feira diz ainda que a medida pretende “garantir aos profissionais de saúde envolvidos no procedimento de interrupção da gravidez segurança jurídica efetiva para a realização do aludido procedimento nos casos previstos em lei”.

Na prática, a portaria inviabiliza o atendimento das mulheres e meninas vítimas de violência sexual nos serviços de saúde, ao exigir: notificação da autoridade policial pelo médico, com preservação de evidências; parecer técnico médico; aprovação de uma equipe de saúde multiprofissional; dentre outros procedimentos, sem inclusive determinar prazos. A polícia e os médicos podem demorar o prazo que quiseram para darem seus laudos e as mulheres perdem o prazo legal para interromper uma gravidez decorrente de uma das maiores violências contra as mulheres, que é a tortura do estupro.

No Brasil, o aborto só é permitido por lei em três situações: quando é consequência de estupro; se há risco de vida para a mãe; ou se o feto é anencéfalo. A não ser nessas hipóteses, o aborto provocado no país é crime tipificado no Código Penal.

Desde 2005, o Ministério da Saúde se guiava por uma Norma Técnica chamada “Atenção Humanizada ao Abortamento”, construída por muitas mãos, cabeças e corações dos movimentos feministas, dos profissionais de saúde e parlamentares feministas. Uma construção coletiva que espelhava tantas lutas de tantas mulheres e mesmo de profissionais da saúde, deixava claro que para o cumprimento da Lei não era necessária a comunicação à polícia da violência sexual sofrida pelas mulheres ou meninas, e nem autorização do Judiciário. Afirmava a autonomia das mulheres, respeitava suas vozes, tornava obrigatório o atendimento nos serviços públicos de saúde, respeitando objeção de consciência do profissional, mas não da instituição de saúde. Dessa forma, o aborto se caracterizava como uma questão de saúde pública e um direito de escolha das mulheres.

A portaria é uma forte reação à mobilização do movimento de mulheres. Demonstra como o entendimento do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos no caso da menina do Espírito Santo é parte do projeto de governo fundamentalista. Se associa àquela cena de dezenas de pessoas ajoelhadas com terços na mão, rezando em frente à portaria principal do Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros (CISAM), na cidade de Recife, no último domingo (16), e os gritos e atos violentos contra uma menina de 10 anos, que carregava em seu corpo infantil uma gravidez resultante de estupro.

São práticas de violência e discursos de ódio e crueldade que questionam a própria condição humana que estamos vendo ocorrer em diversas situações.

Esta portaria evidencia como este tipo de fundamentalismo está compondo o executivo, que dissemina ações institucionalizadas e discursos de ódio que sustentam o sistema patriarcal, capitalista e racista.

Estamos nos associando a Deputada Jandira Fegalhi e demais deputadas que protocoloram um PDL 381 que exige a suspensão imediata desta portaria.

Queremos a SUSPENSÃO IMEDIATA da Portaria 2.282 de 27 de agosto de 2020.

Não precisamos de um crivo policial ou médico para atestar as violências sofridas e decidir o que será de nossas vidas.

Precisamos de aborto legal, seguro e gratuito para todas que escolherem!

Aborto não é caso de polícia. É direito!

É pela vida das mulheres! Fim da cultura do estupro.

NAPPS – Núcleo de Acompanhamento das Políticas Públicas para as Mulheres

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